O aumento da cota isenta de tarifa externa do Mercosul para
compras de trigo em países fora do bloco comercial é uma opção em caso de
necessidade por desdobramentos da guerra na Ucrânia, afirmou nesta terça-feira
a associação que representa as indústrias processadoras do Brasil
(Abitrigo). Atualmente, o setor no Brasil, um dos maiores importadores
globais de trigo, paga uma taxa de 10% para importações que excedem uma cota de
750 mil toneladas ao ano isenta de tarifa.
"Reforçamos que a Abitrigo não pedirá um aumento desse
volume (da cota), mas que esse assunto pode voltar à tona caso a situação de
fornecimento piore. Nesse caso, entendemos que o governo poderia ter de
examinar a possibilidade de isentar a TEC de volumes acima daquela
tonelagem", disse o presidente da Abitrigo, Rubens Barbosa, em nota nesta
terça-feira.
A afirmação foi feita em momento em que o mercado em Chicago
opera em máximas, após subir mais de 35% desde o início da guerra, diante de
temores de escassez no mundo por conta do conflito no Leste Europeu, grande
fornecedor do cereal.
Em 2020, quando a oferta apertou no Mercosul, a indústria
brasileira foi contemplada com uma cota adicional, o que elevou o volume anual isento
de taxa para 1,2 milhão de toneladas.
Os Estados Unidos são, em geral, os maiores fornecedores do
Brasil fora do Mercosul, e tendem a se beneficiar de uma cota adicional sem
tarifa. Os moinhos brasileiros adquirem a maior parte de suas necessidades dos
parceiros comerciais Argentina, Uruguai e Paraguai, que vendem com isenção de
taxa.
Em 2020, quando a cota extra vigorou, o Brasil importou 733
mil toneladas dos EUA, além de 237 mil toneladas da Rússia, e outras 115 mil
toneladas do Canadá, com os países do Mercosul respondendo pela maior parte da
oferta externa adicional. Naquele ano, o Brasil importou 6,16 milhões de
toneladas, segundo dados do governo.
Em 2021, quando o Brasil colheu uma safra recorde, as
importações dos EUA somaram somente 90 mil toneladas, enquanto russos venderam
28 mil toneladas, com a Argentina abocanhando uma parcela maior, de quase 5,5
milhões de toneladas.
O sensível tema, uma vez que agricultores brasileiros podem
perder oportunidades de negócios com o trigo trazido de fora do Mercosul, foi
mencionado em uma nota da Abitrigo que revelou um encontro com a ministra da
Agricultura, Tereza Cristina, na última quinta-feira, para discutir a forte
alta do cereal no mercado global.
O Brasil praticamente não compra trigo da Rússia e não
registra importações do produto ucraniano, mas um eventual aperto na oferta
brasileira, como efeito da guerra, não é descartado.
Primeiro porque a Argentina, tradicional e grande fornecedor
do Brasil, pode vir a atender mercados que eram clientes dos países do Leste
Europeu; segundo, pelo fato de o Brasil, por si só, estar exportando volumes
recordes, com negócios recentes também relacionados aos efeitos do conflito.
Repasse de custos
O aumento da produção do grão no Brasil foi um dos assuntos
debatidos na reunião com a ministra. A Abitrigo reforçou a importância do apoio
do governo ao projeto da Embrapa, que visa a ampliação da área plantada no
norte do Cerrado.
O executivo também fez uma exposição quanto às perspectivas
e os impactos da situação para o mercado do trigo, e comentou que o repasse de
custos do cereal pode ser inevitável.
"Ressaltamos a nossa preocupação com o substancial
aumento do preço e o peso que isso representa para a indústria. Mencionei ainda
que cada empresa decidirá o que fazer, mas assinalei que seria difícil evitar
algum repasse para o preço da farinha", disse ele.